Parte 9: A procura da monetização perfeita
Eduardo BelottiMembro Experiente
Publicado há 285 dias • Editado há 256 dias

Parte 9: A procura da monetização perfeita

Estamos no começo de 2018.

O Real Valor tinha pouco mais de um ano.

Acabamos de receber 150k de investimento da ACE.

Estamos chegando na marca de 100 milhões de reais monitorados na plataforma.

Mas a gente tinha alguns problemas grandes para resolver.

O app tinha sido desenvolvido por mim e pelo Gabriel sem conhecimento prévio de programação. A gente foi criando gambiarra em cima de gambiarra e tinha chegado o momento em que qualquer funcionalidade nova que a gente fazia trazia consigo bugs inesperados.

Parecia magia negra. A gente subia um gráfico novo e dava bug no login. Adicionava suporte a um novo tipo de investimento e agora os gráficos ficavam malucos.

Os bugs começaram a se somar. Era o famoso “débito técnico”.

A gente precisava refatorar o app com alguém que soubesse o que estava fazendo.

Além disso, a gente tinha um problema graaaande que já nos acompanhava a meses: monetizar.

Vamos contratar o Ferolla

Como a gente não monetizava, a gente gastava o MÍNIMO do MÍNIMO possível como empresa.

Mas agora a gente tinha 150k.

Era chegada a hora de finalmente contratar um desenvolvedor para dar uma profissionalizada no nosso código.

Eu parei de comentar sobre as gambiarras que a gente fazia programando lá pelo texto 3 ou 4 para não ficar repetitivo. Mas a gente continuava programando, portanto, fazendo-as.

Lembra do Ferolla? Era o desenvolvedor freelancer que fez a parte de processamento de pagamentos para a gente botar o premium no ar (que a gente tirou do ar pouco tempo depois).

Eu, Gabriel e Ferolla em uma reunião.

Ele fez um baita trabalho e se mostrou ser 100% solícito.

A gente mandava mensagem sábado, domingo, feriado… E ele sempre respondia.

Ele era sinistro em Javascript. E existia um framework para criar apps híbridos que era em Javascript. React Native.

Propus ao Gabriel:

“E se a gente trouxer o Ferolla para ser nosso primeiro funcionário? A gente encarrega ele de reescrever o app que a gente fez com as melhores práticas de desenvolvimento e ele faz isso em React Native?

A gente consegue melhorar o app e de quebra ainda teremos uma versão para iPhone”

Sempre tive dificuldades de convencer o Gabriel com os meus planos. Talvez pelo fato dele ser MUITO racional e eu ser meio maluco.

Mas aquele plano parecia bom demais para ser verdade. A gente resolveria 2 problemas de uma vez: app mais otimizado e versão iOS.

Essa foi uma das poucas vezes que o Gabriel concordou rapidamente sem hesitar.

O desafio deixou de ser convencer o Gabriel e passou a ser convencer o Ferolla a vir trabalhar para a gente ganhando MUITO pouco.

Por mais que 150k seja bastante dinheiro, a gente não monetizava ainda, então não podia se dar ao luxo de pagar salário alto.

Conversamos sobre a ideia com o Ferolla.

Mostramos o que estávamos construindo e como achávamos que aquele business tinha potencial de ficar muito maior. Algumas soluções parecidas, como WealthFront e Betterment já tinham valuations de centenas de milhões nos EUA.

Combinamos um salário bem baixo. Coisa de sei lá… 1000-1500 reais por mês e mais um percentual da empresa na forma de vesting.

Ferolla estava dentro.

Ele comprou a ideia do Real Valor.

Mesmo sabendo que poderia ganhar mais de 6k como desenvolvedor em qualquer empresa estabelecida de tecnologia, ele optou por trabalhar com a gente para ganhar uns 1200 mais um percentual da empresa.

Seu objetivo pelas próximas semanas seria fazer uma v2 do Real Valor, construída com as melhores práticas e finalmente fazer nossa versão iOS.

Para conseguir fazer a parte do iOS era necessário um Mac que nenhum de nós três tinha. Consegui um emprestado com o namorado da irmã da minha namorada na época. Ele salvou a gente.

Depois trago mais informações de como foi o lançamento dessa versão nova. Vamos para a próxima pauta

Criando o Blog

Além dos desafios de refatorar o app e monetizar, a gente estava começando a esbarrar na dificuldade de trazer novos usuários.

Sabe aquele gráfico do Crossing the Chasm? Parecia que a gente estava chegando no Chasm.

Why Crossing the Chasm Doesn't Work for Workplace Products · Worklife Blog


A gente já não trazia mais novos usuários pelas comunidades de investimento do Facebook e precisava de uma nova estratégia de aquisição.

Anúncios estavam fora de cogitação.

Além das palavras-chave de investimentos serem muito caras por causa da concorrência com grandes bancos e corretoras, a gente não monetizava ainda. Não fazia sentido gastar dinheiro para conseguir downloads porque a gente não tinha um jeito de transformar downloads em dinheiro ainda.

A estratégia escolhida para expandir nossa aquisição de usuários foi a criação de um blog.

Não fazia sentido falar só sobre acompanhamento de investimentos. Esse assunto é muito limitado e o publico alvo muito pequeno.

O blog deveria ter textos para cada fase da jornada do investidor: desde o momento que ele decide investir e quer descobrir como começar até o momento em que ele já tem investimentos e quer saber como acompanhar da melhor maneira possível.

Como tudo nessa jornada de empreendedor, eu não tinha NENHUMA experiência escrevendo antes, mas dei uma estudada e simplesmente comecei.

Print do primeiro post da história do blog do Real Valor (hoje ele já nao existe mais)

Até a venda do Real Valor, foram mais de 100 textos com mil palavras cada. Isso dá um livro de umas 320 páginas.

A estratégia do blog demorou até começar a dar resultados, mas depois foi uma das principais fontes de aquisição até a aquisição da companhia.

Desde então, tomei o gosto pela escrita e cá estou eu contando a história do Real Valor.

Decisão de trocar de nome

Nessa jornada de aumentar nossos esforços de aquisição de usuários, ficou claro que a gente precisava se tornar autoridade no assunto de investimentos.

Nessa época, eu era usava meu sobrenome Vargas. Quem gosta de futebol sabe que tem um homônimo chileno que já jogou em diversos times brasileiros: o Eduardo Vargas.

Se você procurar no Google por Eduardo Vargas, vai encontrar resultado para caramba. TUDO é falando sobre ele e não sobre mim.

Como que eu iria virar uma autoridade com uma concorrência tão grande pelo nome?

Decidi “trocar de nome” para um outro sobrenome meu que poucos conheciam até então: Belotti.

Até hoje tenho amigos que nunca souberam o motivo de eu “mudar de sobrenome” do nada.

A resposta é simples: concorrência.

Quando se busca no Google por Eduardo Vargas, se encontra 40 milhões de resultados. Se a busca for por Eduardo Belotti, estamos falando de 600 mil resultados.

Quase 100 vezes menos competição. Muito melhor.

Na minha nova fase de escritor, eu virei o Eduardo Belotti (e sou ele desde então).

PURO CAOS

Pode parecer que meus textos estão cada dia mais caóticos: no texto passado eu falava que o importante era monetizar e acabei de passar metade do texto ignorando monetização e falando sobre outras coisas.

Por que isso?

Porque eu estou tentando refletir no texto o caos que é tocar uma startup. Estou tentando fugir do padrão linear de um livro biográfico e mergulhar o leitor no puro caos que eu estava vivendo.

Com certeza a leitura fica mais difícil, mas entenda isso como uma idiossincrasia do autor. Estou tentando fazer a minha arte aqui.

Parece calmo, mas era puro caos.

Voltando à história.

A gente tentava aumentar a base de usuários, diminuir o churn, pensar num modelo de negócios que desse dinheiro enquanto melhorava o produto.

Tudo ao mesmo tempo.

Novas formas de monetizar

A gente estava decidido a não monetizar cobrando assinatura porque além de ser contra a missão de democratizar investimentos, também era contra o que os usuários queriam.

Os usuários adoravam a plataforma, mas não estavam dispostos a pagar nem R$ 9,90 por mês.

Era tipo portal de notícia.

Eu sei que você fecha a notícia assim que sobe um paywall de R$ 5,00 por mês.

O nosso usuário também fechava o app quando a gente pedia para ele assinar.

Mas os portais têm um outro jeito de fazer dinheiro: anúncios.

Assim como os portais, a gente precisava de uma outra forma de fazer dinheiro.

White Label

Uma das ideias era transformar o Real Valor em White Label e vender isso a grandes players do mercado.

White Label é um produto desenvolvido por uma empresa, mas com a marca, identidade visual etc. da empresa que contrata.

Sabe quando você vai num supermercado e eles tem ketchup, biscoito, cereal, refrigerante de marca própria?

Aquilo é um white label.

Produtos de marca própria da carrefour na verdade é white label de outra empresa.

O supermercado fabrica nenhum daqueles alimentos. Existem fornecedores que fazem o produto e colocam a embalagem que o supermercado quiser. Isso é um white label.

A ideia por trás é: a fábrica tem o know-how e o equipamento para fazer alimentos, mas não tem a distribuição.

O supermercado tem a distribuição, mas quem aumentar a margem vendendo produtos próprios.

Bingo. Os dois saem ganhando.

No mundo do software, esse conceito de white label é bem consolidado.

Sabe aqueles serviços que no plano free tem alguma marca d’água da empresa (tipo powered by fulano), mas no plano pago você pode colocar o seu logo, suas cores e etc.?

Isso é um white label no mundo digital.

A gente percebia que o acompanhamento de investimentos era tarefa complicada para o mercado como um todo. Se a gente conseguisse vender o Real Valor como white label para corretoras ou casas de research, seria um golaço.

Eles entregariam valor para seus clientes que não conseguiam acompanhar os investimentos muito bem e de quebra teriam acesso a dados que sempre sonharam em ter.

Empiricus

Empiricus era uma casa de análise de investimentos, o que significa que eles recomendavam investimentos para seus clientes.

Depois de investir, eles não tinham uma forma de ajudar os clientes a acompanharem o andamento dos ativos.

Eu senti essa dor na pele: assinava alguns relatórios e depois de comprar, vender e aumentar a posição em alguns investimentos, me peguei pensando: “mas pera aí… quanto de dinheiro eu estou ganhando no total aqui?”.

Fazia total sentido a Empiricus fornecer um app gratuito para seus clientes conseguirem acompanhar. Seria uma entrega de valor ainda maior do que eles já tinham.

Algumas telas de como seria o white label Empiricus.

De quebra, a empresa conseguiria entender como os seus leitores investem. Com esses dados, eles poderiam melhorar os seus próprios relatórios.

Como a Ace tinha uma boa relação com a Empiricus, pedimos para eles tentarem marcar uma reunião para a gente.

O pessoal conseguiu uma reunião com o Rodolfo Amstalden, um dos fundadores da Empiricus para dali umas semanas.

Eu e Gabriel criamos uma apresentação mostrando o que a gente imaginava que seria um produto foda:

  1. Um com a cara da Empiricus, mas com a usabilidade do Real Valor para o cliente acompanhar os investimentos.

  2. Uma base de dados onde a Empiricus poderia entender o seu cliente muito mais a fundo.

Contratamos um designer freelancer para fazer todas as telas com a aparência Empiricus para causar impacto. Foi doloroso gastar dinheiro nisso porque poderia não dar em nada, mas foi necessário.

Vou deixar um link no final do texto para essa apresentação, caso tenha curiosidade de ver.

Reunião com a Empiricus

Eu estava nervoso para caceta de fazer uma reunião com o Rodolfo.

Eu era assinante do relatório dele. Adorava o jeito que ele escrevia. Ele não sabia quem eu era, mas eu sabia quem ele era.

Olhando para trás, parece até bobo ficar nervoso para uma reunião dessas, mas na hora era inevitável.

A gente estaria tentando vender o nosso produto para um dos caras que foi responsável por me fazer aprender a investir.

A vida prega peças ne?

Em 2016 eu trabalhava como consultor de gestão e lia seu relatório, Mercado em 5 Minutos, todos os dias no translado para o trabalho.

Um relatório desses, recebido em março de 2016.

Dois anos depois, em 2018, cá estou eu entrando numa sala com Rodolfo Amstalden para apresentar um produto que eu desenvolvi com o intuito de fazer uma parceria.

Doideira.

A gente apresentou o que a gente tinha em mente, eles ouviram e gostaram.

Mas fizeram uma ponderação importante:

“Se a gente fizer essa parceria, no momento que a gente mandar um email falando para o pessoal baixar, vocês vão crescer 10 vezes. A gente não quer fazer isso se não formos sócios.”

O que ele estava dizendo era: só faremos essa parceria se a gente tiver um pedaço da empresa.

O problema é que a gente achava que a empresa valia muito mais do que o que eles achavam que valia.

Aquela parceria com a Empiricus nunca sairia do papel, mas ficou claro que eles tinham algum interesse em ser sócio da gente. Essa informação seria importante no decorrer da história do Real Valor.

Muito legal, mas o que a gente queria era receita. E nesse sentido, a reunião foi uma merda: não conseguimos converter a Empiricus em cliente.

Detalhe: na saída do prédio, eu acabei jogando o crachá da Ace ao invés do da Empiricus. O que me fez ficar com uma lembrança daquele dia até hoje.

Crachá do prédio do escritório da Empiricus.

Vamos ao próximo.

Escritório de assessoria

Na vida como empreendedor, se conhece muita gente. Não sei se você se lembra, mas eu comecei a morar na república no lugar de um amigo, o Paulo.

Paulo tem um irmão, o Igor, que estava trabalhando numa empresa de open banking com o Ricardo. Um dia fomos conhecer o Ricardo para entender se existiam possíveis sinergias.

Ricardo falou de um grande amigo, o Edgar que era sócio de um dos maiores escritórios de assessoria do Brasil e que eles com certeza iriam adorar conhecer o Real Valor.

Paulo apresentou Igor que apresentou Ricardo que apresentou Edgar e lá estava a gente indo para uma reunião com um dos maiores escritórios de assessoria do Brasil: a Acqua Investimentos.

Para contextualizar, um escritório de assessoria de investimentos é uma empresa que está conectada a uma corretora e vende os produtos daquela corretora para clientes. A corretora e o escritório repartem a receita de cada produto que o cliente compra, como renda fixa, ação, opção, fundo, etc.

É como se fosse um franquiado do Mcdonalds. Ele vende produtos Mcdonalds e fica com uma parte da receita.

As franquias foram essenciais para o Mcdonalds crescer rápido. Os escritórios de assessoria fizeram a mesma coisa para a XP.

O plano era similar ao adotado com a Empiricus: tentar vender um white label do Real Valor.

A proposta de valor para o cliente final era a mesma: conseguir acompanhar os investimentos com mais qualidade.

Mas para o escritório, a proposta de valor era mais poderosa: conseguir ver todos os investimentos do cliente.

Assim como para a reunião com a Empiricus, eu e Gabriel passamos um bom tempo preparando apresentação do que a gente achava que fazia sentido.

Contratamos o mesmo freela designer para fazer umas telas bonitas para o escritório.

Pausa rápida para explicação sobre Share of Wallet

É incomum investidores terem todo o seu dinheiro em apenas uma corretora. Muitas vezes o dinheiro está espalhado em outras corretoras e/ou bancos.

Os escritórios costumam trabalhar para aumentar o percentual do patrimônio do cliente que está sob sua “gestão”, o Share of Wallet.

Um dos problemas do escritório é que ele não tem uma informação precisa do Share of wallet e nem de quais ativos esse cliente tem fora da corretora.

O Real Valor era uma forma do assessor conseguir ver o portfolio do cliente de forma global.

Pode parecer bobagem, mas um assessor passar a ter dados globais do patrimônio do cliente é tipo um míope colocar óculos pela primeira vez na vida.

Reunião com a Acqua

A gente começou a explicar o que a gente estava fazendo e os olhos de um dos fundadores começou a brilhar. Em poucos minutos de reunião ele já tinha entendido tudo e era exatamente o que ele queria.

Infelizmente essa é a melhor qualidade da imagem que achei com as telas para a Acqua

Ele nos interrompia a todo momento transbordando com ideias do que a gente poderia fazer junto. Foi ANIMAL.

Maaaaaaaaaaaaaaaaaas, como tudo nessas 9 partes até agora, tinha um probleminha.

Como eles eram uma corretora associada a XP, eles não poderiam usar um white label sem antes ter a permissão da própria XP.

Mas logo depois de apresentar esse problema, ele já trouxe a solução:

“Isso aí é o de menos. Vou mandar um email agora para o Gabriel Leal e a gente faz uma reunião lá. A XP vai querer botar vocês para dentro, porque se todos os escritórios tiverem essa funcionalidade, a XP como um todo vai captar MUITO mais”.

Ele escreveu um email ao Gabriel Leal (o número 2 da XP na época) ali na nossa frente mesmo e nos colocou em cópia.

A ideia era conseguir uma reunião com o Leal e mostrar o que a gente estava fazendo para a XP dar o aval e a gente prosseguir.

A gente saiu dessa reunião energizado.

Finalmente a gente tinha achado um jeito de fazer dinheiro. E não seria pouco dinheiro. A gente ia fazer dinheiro para CARALHO!!!

Só faltava convencer o Leal.

Próximo capítulo

Tudo indicava que estávamos no caminho certo agora.

A monetização estava encaminhada: só falar com Leal A versão iOS estava encaminhada: só dar tempo ao Ferolla

Mas, por coincidência ou não, essa era a época do lançamento do filme Vingadores 3.

E parece que o estalar de dedo do Thanos não afetou só o universo Marvel. Afetou o Real Valor também.

Pelo menos é o que parecia, porque tudo estava correndo bem e de uma hora para a outra, FUDEU TUDO.

PS: Link da apresentação que fizemos na Empiricus: https://drive.google.com/file/d/1GqBPFIhjl2sCYpYzjNljujOabtXR45ru/view?usp=drive_link

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