Me deparei com um problema nos últimos textos.
Eu não estou conseguindo escrever tudo que eu quero por causa da limitação que eu coloquei quando comecei. Eu claramente subestimei o tamanho da história.
Contá-la em 15 partes é pouco.
Nos primeiros textos, eu tinha uma puta liberdade de estender um assunto, explicando o que eu estava pensando naquele momento.
Agora, na décima primeira parte, estou tendo que comprimir passagens importantes para caber em 15 partes. Mas isso está estragando a história.
Hoje tomei uma decisão que combina com a jornada de um empreendedor: vou mudar os planos.
Não vou mais me ater a 15 partes.
Vou voltar a escrever do jeito que eu vinha escrevendo nos primeiros textos.
Quantas partes essa história vai passar a ter?
Sei lá.
A quantidade necessária para conseguir contar a história com alma e não simplesmente uma sequencia de eventos.
Vamos ao texto.
Recapitulando: a aceleração da ACE era de 4 meses no ACE Start e 6 meses no ACE Growth.
O Start era para validar a ideia. O Growth era para crescer a empresa.
Durante toda a aceleração, a gente tinha acesso a um coworking de graça.
Coworking da ACE estava chegando ao fim
Mas agora a gente estava chegando no fim de 2018 e a aceleração estava acabando.
A gente ia deixar de ter o coworking de graça. Estava chegando a hora de começar a pagar pelo escritório.
E sempre quando surge o papo de pagar, eu e o Gabriel tínhamos calafrios.
Isso levantava uma questão importante: devemos ficar em SP ou voltar para o RJ?
São Paulo é a terra da oportunidade no Brasil.
O mercado financeiro é quase que todo lá.
Qualquer potencial parceria começaria com uma reunião. E as reuniões eram todas lá.
Lembre que estamos antes da pandemia. Não existia começar uma parceria por call.
Se o nosso principal problema era gerar receita, ficar em São Paulo provavelmente nos ajudaria muito mais nessa linha do que voltar para o Rio.
O problema é que morar em São Paulo custava 3-4k por mês. E isso saia do meu patrimônio pessoal, visto que não tinha tirado 1 centavo da empresa como pró-labore até então.
Voltando para o Rio, era possível diminuir esses custos pessoais voltando a morar com meus pais. Nesse momento não existe ego. Só existe a necessidade de maximizar os esforços para a empresa dar certo.
O problema é que se o Real Valor voltasse pro Rio, a empresa ficaria um pouco isolada do mercado.
A gente poderia perder momentos de serendipidade simplesmente por não conseguir ir a eventos, não conseguir encontrar pessoas importantes do mercado, etc.
Mas isso é um pouco subjetivo. É difícil de quantificar.
Apesar de eu conversar com o Gabriel sobre o que a gente faria quando a aceleração acabasse, ainda tinha tempo.
E existiam problemas maiores, tipo como fazer mais dinheiro.
Apesar da parceria com a Monte Bravo estar rodando, a receita ainda era ínfima.
Como ela consistia em conversão e a gente ainda não tinha azeitado o processo inteiro, ainda tinha muito trabalho a fazer.
A gente estava imerso nesse desafio de como fazer mais gente converter na Monte Bravo.
Tudo mudou quando Gabriel me chamou para trocar uma ideia numa sala de reunião.
“Cara, eu preciso voltar pro Rio. To na merda. Não consigo ficar mais em São Paulo”
Gabriel começou a falar isso e começou a escorrer lágrimas dos olhos.
Eu não sabia o que estava acontecendo. Nunca tinha visto o Gabriel assim.
Parecia que ele estava no limite.
Mas no limite de que? Eu não estava sabendo de nada. Fui pego de surpresa.
Ele continuou falando e aos poucos explicou o que estava acontecendo.
Ele estava muito tempo longe da namorada, da família, o Real Valor estava patinando. A gente não estava conseguindo trazer tantos usuários novos, a gente n estava tirando dinheiro, a parceria com a Monte Bravo, apesar de ter muito nome não estava rendendo quase nada.
Mas hoje eu acho que o que estava atormentando a cabeça dele não era “só” isso.
Ele estava no limite do emocional ali e simplesmente não conseguia continuar em SP. Mas ao falar isso, ele estava pensando que estava “fraquejando” como empreendedor. Era isso que estava fazendo ele ficar daquele jeito.
Eu AAACHO que era uma batalha interna dele, do tipo: “Porra… a gente fez isso do zero. Resolveu uma PORRAAAADA de problema e agora eu estou “fraquejando” com algo tão simples.”
Ele sempre se cobrou demais.
Mas ele não imaginava a minha resposta.
“Se você precisa ir pro RJ, a gente vai pro RJ. Foda-se.”
Na minha cabeça não fazia sentido a gente se separar. O nosso diferencial era estar junto todos os dias, ter ideias, insights. A gente é muito complementar. Eu tenho ideias malucas e ele sempre puxa para termos os pés no chão. A gente não podia se separar. O Real Valor perderia muito.
Em 1 minuto de conversa a decisão estava tomada.
O Real Valor voltaria para o Rio.
Lembro dele olhando para mim com certo alívio depois que eu falei isso. Tenho certeza que ele achou que eu seria resistente a volta porque sabia que eu achava melhor pro Real Valor ficar em SP.
Só que eu achava isso do ponto de vista estritamente profissional. E no mundo real não da para separar o profissional 100% do pessoal.
Não faz sentido a empresa prosperar e a sanidade ir pro caralho. Vamos voltar pro RJ.
Entre essa conversa e voltar para o Rio de mala e cuia foi papo de 1 semana.
A vida é trem bala, parceiro.
Em startup, mais ainda.
Voltando para o Rio, fomos direto para a biblioteca da PUC e voltamos a trabalhar.
Mas a PUC não era mais a nossa casa. Era um local temporário até a gente achar um escritório.
O Real Valor não era mais um projetinho de 2 malucos que nem sabiam programar.
Era um CNPJ constituído, que a ACE investiu 150k. Que já tinha uns 4 mil usuários ativos. Que tinha parceria com a Monte Bravo e buscava cada vez mais parcerias.
A gente precisava de um lugar.
Não dava para fazer call no meio de uma GALERA na biblioteca.
A parte legal de voltar para a PUC é que a gente foi recebido como rockstars pelos amigos que estudavam lá.
Para eles, a gente estava voando e enriquecendo.
Olhando de fora parecia legal mesmo.
Os 2 caras que começaram aqui, do nada e foram pra São Paulo, receberam investimento e decidiram voltar.
Tipo aquele jogador de futebol que é ídolo do time, vai pra Europa e, no auge, decide voltar ao clube por amor, sabe?
Como eu me senti voltando para a biblioteca
Mas a situação não era bem essa para a gente, que estava no dia a dia.
A gente não estava fazendo dinheiro, não estava tirando dinheiro.
Apesar de ter uma base de alguns milhares de usuários, a gente só conseguia ver problemas.
Nessa época, um amigo do Rio deu uma dica: ia abrir o edital do Startup Rio 2019.
O Startup Rio é uma inciativa do governo do Rio para fomentar startups.
Na época, eles estavam investindo até 96k equity free. Isso é basicamente “dinheiro de graça”, visto que eles não se tornariam sócios.
Esse programa apareceu no momento que a gente ia começar a buscar investimentos de fundos.
Apesar do nosso custo mensal ser baixo, da ordem de 6-8k, a gente tinha tido alguns gastos pontuais bem altos, como um designer ex Guia Bolso que refez toda a nossa UX e deixou o app ABSURDO.
O caixa estava começando a ficar depletado e o Startup Rio parecia cair como uma luva.
A gente se inscreveu.
Logo atrás da PUC tinha um coworking. Ele se chamava Templo. Não sei se você se lembra, mas eu conheci a ACE num evento justamente lá.
O ambiente era MUITO diferenciado.
Eram 2 casas que os donos remodelaram para ser um coworking.
Não era um escritório corporativo normal.
Tinha quintal, tinha formato de um casa. Era uma vibe completamente diferente.
Muito legal.
O Real Valor era carioca por natureza. E a gente queria retomar essa pegada carioca depois de uma temporada paulista.
A disposição do Templo conversava mais com a vibe do Real Valor do que um escritório 100% sério como os de São Paulo.
Fechamos o contrato.
Uma parte do coworking do Templo na Gávea
Começamos a trabalhar, mas encontramos uma red flag nos primeiros dias.
Os inquilinos eram beeeeeem diferentes do que a gente estava acostumado na ACE.
Tinham duas empresas de cerveja, uma de café, uma bio-horta.
A gente estava acostumado a ter empresas de tecnologia a nosso lado. Na ACE ficamos muito próximos de uma startup de dating, app de nutrição, plataforma online para varejo, impressão 3d de próteses. Sem contar as outras que não eram próximas, mas também estavam ali… lado a lado.
Se eu tivesse uma dúvida numa estratégia de inbound marketing, de arquitetura de software, de melhores práticas de parcerias com empresas, etc. Era só virar pro lado e começar a bater um papo.
A gente não teria aquilo no Templo.
Aquilo não ia dar certo.
Nem eu nem o Gabriel curtimos e decidimos sair ainda no primeiro mês mesmo.
Voltamos para a Puc por uns dias e continuamos a busca para achar um escritório para a gente. Os Coworkings do Rio eram caros e não tinham a pegada de tech tão forte quanto a de São Paulo.
Ate que descobrimos que a Oi tinha um coworking para empresas investidas por eles. Ele se chamava Oito.
Coworking Oito
Como eles estavam começando com isso, tinham poucas startups e muito espaço vazio.
Eles estavam atras de startups para “povoarem” aquele espaço e criarem um ambiente produtivo para as investidas.
A gente estava buscando exatamente um ambiente com várias empresas de tecnologia, afinal empresas de tech se beneficiam de ter empresas tech ao redor.
Só que não era trivial entrar no Oito. Eles escolhiam as startups que poderiam entrar. Eles não queriam “qualquer uma” ali.
Ai entrou a ACE.
Eles tinham contato com o pessoal da Oi e venderam o nosso peixe.
Nos mudamos para lá.
Era papo de 900 reais por mês para 2 assentos. MUITO BARATO.
E o mais importante: o ambiente era FODA!!
Agora sim… O Real Valor tinha um escritório.
A gente iria receber cerca de 80k sem ceder equity e teríamos um coworking de graça por um tempo lá.
(Porra… logo agora que a gente fechou um contrato com o Oito?)
A gente não tinha escritório até outro dia e agora tinha 2. A vida de startup é mesmo uma maluquice.
Real Valor dentre os classificados para o Startup Rio
A notícia do Startup Rio foi muito importante.
Até esse momento, a gente estava cogitando buscar investimento e cortar custos.
Agora a gente relaxou com a busca de investimento e precisava contratar desenvolvedor (estava no escopo do projeto que foi aprovado para a gente).
Mas se você acha que tudo eram flores, está enganado.
Uma aceleração dessas não é só receber o dinheiro e gastar como bem entender.
A gente ia passar por um programa tipo o da ACE.
Tinha que ir a workshops e fazer “dever de casa”.
A merda é que a gente já tinha feito todos esses “deveres de casa” na ACE.
Lembra das entrevistas com usuário que a gente fez antes de começar o Real Valor e quando chegamos na ACE tivemos que refazer?
Agora era o Hat Trick.
Quem aguenta fica fazendo entrevista quando você já sabe as respostas e tá com um problemão para resolver?
Maaaaaaaaaaaaas o Gabriel percebeu uma coisa importante:
“Cara, a gente tá patinando. Talvez seja bom para a gente parar, fazer esses workshops e repensar a empresa, as parcerias, as entrevistas”.
E se a gente pudesse usar esses workshops para ter mais clareza do que queremos que o Real Valor seja?
E assim fizemos. Fomos tocando os workshops sempre pensando no que a gente poderia transformar o Real Valor para fazer mais dinheiro.
Apesar de voltar para o Rio, a parceria com a Monte Bravo continuava rolando. Ela não estava na velocidade que a gente (e nem a Monte Bravo) acreditava que tinha potencial, mas a ente fazia ajustes aqui e ali para ir melhorando.
Viajei uma ou duas vezes para São Paulo para encontrar com o pessoal de lá e ir traçando estratégias e testes para melhorar.
Numa dessas reuniões, eles reforçaram muito que a gente poderia fazer coisas grandes juntos.
Quando sai da reunião, mandei pro Gabriel.
“Cara, eles estão querendo comprar a gente? Não entendi”
“Cara, também não entendi direito. Mas acho que sim”
Porra. Foi um negócio meio sutil.
A gente não tinha certeza, mas parecia que eles queriam comprar a gente.
O que que a gente faz agora?
Fomos para o play book clássico do Real Valor: quando diante de uma situação que nunca viveu antes, buscar conhecimento com quem já viveu isso. Seja em livros, vídeos, conversas.
Nesse caso, fomos para a ACE.
“Acho que estão querendo comprar a gente. E agora?”
Tivemos uma reunião com o Mike, um dos fundadores da ACE… Ele é fundador da Blowtex de camisinhas (já vendeu), abriu empresa nos EUA, abriu capital em bolsa e depois foi comprado.
Ele entende de aquisições.
Ele também entendeu que eles estavam querendo comprar a gente e começou a nos ajudar a traçar um plano para fazer esse deal.
Não preciso nem falar sobre o que vai ser o próximo capítulo ne? Sobre como foram as conversas para vender a empresa para a Monte Bravo.
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